sexta-feira, 5 de novembro de 2010

Adeus !

Meu mal se agrava não creio
Que volte a ver-te Maria
Na minha triste agonia
Mando uns versos te escrever
Dito as palavras baixinho
E um amigo dedicado
Vai batendo no teclado
Tudo que eu quero dizer.

Se me visses nesse instante
Talvez dissesses não é
Aquele ardente poeta
Cheio de amor e de fé
Minhas faces encovadas
Que já foram madrugadas
São agora a escuridão
Meus sonhos que eram tão grandes
Muito mais altos que os andes
Rolam agora no chão.

Eu que sorria e cantava
Prevendo um futuro de ouro
Não sou mais que uma alma triste
De quem não se escuta o choro
Sobre um leito amofinado
Descrente em pranto banhado
Sozinho longe dos meus
Tentando em vão vida nova
Só tenho um remédio a cova
Só tenho um consolo Deus .

De que me valeram crença
Amores,sonhos,virtudes
Se agora só me reservam
As larvas e os ataúdes?
Meu riso trancou-se em mágoa
A luz do olhar se fez água
E em tosse a voz se fundiu
Como naufrago de Osdilets
Meus olhos contemplam tristes
A terra que já sumiu.

Não quero nem ver o espelho
Para não ver a minha face
É mais um riso que morre
Mais um tormento que nasce
Não sei como em poucos dias
Fugiram-me as energias
Nem um ânimo ficou
Numa compleição de atleta
Uma caveira completa
Em sombra se transformou.

Talvez mais nunca eu te possa
Dizer: " Cheguei meu amor!
Voltou para o ninho d'águia
O peregrino Condor.."
Ai, não Maria a desgraça
Gemendo em meu lábios passa,
No desespero final
Aqueles beijos trocados
São agora amortalhados
Com a minha angústia mortal!

Nem as palavras que dito
Podem levar-te carinhos
São rosas danificadas
Pela tosse dos espinhos
O mal que me rói, não creio
Que tenha remédio veio
Pra de uma vez me levar
Adeus, Maria querida!
Adeus,Amor,Adeus,Vida
Adeus estrela do mar!

As praias onde pisamos
Dizendo versos à areia
Hão de retratar meu vulto
Nas noites de Lua-Cheia
Aqueles matos e flores
Que viram nossos amores
No seu verdejante altar
(Ai,sonho que se consome!)
Hão de chamar por meu nome
Sem nunca mais me encontrar.

Talvez meus ossos nem sejam
Sepultados por ai
Ficarei eternamente
Distante, longe de ti
Perdoa ,se porventura
Fiz-te algum mal ,criatura,
Se o que sonhaste eu não sou...
(Sabes que não sou covarde)
Não chores é muito tarde
Foi a morte que chegou!

Guarda todos os retratos
E as cartas que te escrevi
São lembranças de minh'alma
Que ficaram junto a ti
Dize às praias e as palmeiras
Aos céus e as brisas ligeiras
Que nos viram junto ao mar
Que eu mando as minhas lembranças
E as últimas esperanças
De os rever, de os encontrar!

E quando os jornais da terra
Disserem que ele morreu...
Molha as letras com teu pranto
E exclama: " Sim, era meu!..."
Se chorares comovida
Reza uma prece sentida,
Manda minha alma a Jesus!
Mas, te peço : em absoluto
Nunca te cubras de luto
- Que o nosso amor foi de luz.

Rogaciano Leite

( Datilografados por Irênio Jácomo de Araújo)
Santos , 15 de novembro de 1950

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